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Por professor e jornalista Sadraque Rodrigues – Portal Colombense
Em uma decisão que repercute em todo o cenário político brasileiro, o Supremo Tribunal Federal (STF) reverteu parcialmente a tentativa da Câmara dos Deputados de suspender a ação penal contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), acusado de participação em uma suposta articulação golpista contra o Estado Democrático de Direito. O julgamento reforça a independência entre os Poderes e limita os efeitos de uma decisão parlamentar que vinha sendo criticada por juristas, partidos de oposição e setores da sociedade civil.
A Primeira Turma do STF, composta pelos ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Luiz Fux e Cármen Lúcia, formou maioria para declarar que a resolução aprovada pela Câmara dos Deputados, no dia 7 de maio, é inaplicável às principais acusações que pesam contra Ramagem. Por consequência, o deputado continuará respondendo judicialmente por crimes graves, como tentativa de golpe de Estado, abolição violenta do Estado de Direito e organização criminosa armada.
Entenda o caso
A polêmica teve início quando a Câmara, por meio de uma articulação liderada pela base bolsonarista, aprovou um pedido de suspensão parcial da ação penal em curso no STF contra Ramagem. O argumento era que o deputado, por estar no exercício do mandato, teria direito à prerrogativa prevista no artigo 53 da Constituição Federal, segundo o qual parlamentares só podem ser processados por crimes cometidos após a diplomação e no exercício da função legislativa.
A decisão da Casa Legislativa foi vista por muitos como uma manobra política para blindar Ramagem – aliado próximo do ex-presidente Jair Bolsonaro – e, indiretamente, abrir caminho para que outros parlamentares acusados de envolvimento nos atos antidemocráticos também escapassem da responsabilização judicial.
No entanto, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no STF, foi categórico ao afirmar que os fatos atribuídos ao parlamentar ocorreram antes de sua atual legislatura e, portanto, não se enquadram nas hipóteses de imunidade previstas pela Constituição. Segundo Moraes, a tentativa da Câmara “viola a separação de Poderes e compromete a integridade do sistema de freios e contrapesos do Estado brasileiro”.
O julgamento no STF
A posição de Moraes foi acompanhada integralmente pelos ministros Zanin, Dino, Fux e Cármen Lúcia. Com isso, formou-se maioria na Primeira Turma para manter em vigor o processo penal contra Ramagem, com exceção de dois pontos específicos: os crimes de dano qualificado e deterioração de patrimônio público, relacionados aos atos de vandalismo ocorridos em 8 de janeiro de 2023, em Brasília. Esses dois pontos ficarão suspensos até o fim do mandato do parlamentar.
O ministro Flávio Dino, que assumiu recentemente uma cadeira na Suprema Corte, destacou que o uso político das prerrogativas parlamentares não pode servir como escudo para delitos de natureza golpista. “A imunidade não é um salvo-conduto para o crime. O Parlamento deve ser espaço de representação popular, não de impunidade institucionalizada”, afirmou Dino durante o julgamento.
Repercussão política
A decisão do STF foi comemorada por partidos de oposição, como PSOL, PDT e Rede Sustentabilidade, que foram os responsáveis por acionar o Supremo após a aprovação da medida pela Câmara. As legendas argumentaram que o ato do Legislativo configurava uma invasão de competência, ferindo princípios constitucionais e colocando em xeque a autoridade do Poder Judiciário.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ainda não se manifestou oficialmente sobre o julgamento. Nos bastidores, porém, aliados relataram que a reversão parcial da medida foi recebida com “frustração”, especialmente por deputados que apoiam o ex-presidente Bolsonaro e veem em Ramagem uma figura-chave para a articulação da direita em 2026.
Por outro lado, setores da sociedade civil, juristas e entidades ligadas ao combate à corrupção destacaram a importância da decisão para evitar precedentes perigosos. O jurista Miguel Reale Júnior, em entrevista à imprensa, considerou o julgamento do STF “fundamental para garantir que o Brasil continue sendo um Estado de Direito, em que ninguém está acima da lei”.
Os crimes investigados
Ramagem é acusado de participar de uma organização criminosa que teria atuado nos bastidores para minar as instituições democráticas brasileiras. Entre os fatos investigados, estão reuniões secretas, divulgação de desinformação para enfraquecer o processo eleitoral, envolvimento com grupos extremistas e articulação para obstruir investigações da Polícia Federal e da Justiça Eleitoral.
O Ministério Público Federal aponta que a atuação de Ramagem foi contínua, estruturada e, em certos momentos, com apoio logístico de agentes públicos, inclusive dentro do antigo governo federal. A Procuradoria-Geral da República (PGR) já apresentou farto material probatório, incluindo mensagens, vídeos, documentos e relatos de delatores.
Consequências jurídicas
Com a continuidade da ação penal, o deputado federal poderá ser julgado ainda durante o seu mandato, ao menos pelas acusações mais graves. Caso venha a ser condenado pelo STF, Ramagem poderá ter seus direitos políticos suspensos, ser destituído do mandato e, eventualmente, cumprir pena em regime fechado, a depender da sentença final.
A jurisprudência do STF permite o julgamento de parlamentares no exercício do mandato, desde que os crimes em questão tenham ocorrido antes da posse ou não estejam relacionados diretamente com o exercício do cargo.
Análise institucional
A decisão da Suprema Corte reafirma o papel central do Judiciário na contenção de abusos institucionais e no resguardo da democracia. Ao impedir que o Parlamento interfira diretamente no andamento de ações penais, o STF envia um recado claro: nenhuma autoridade pública está acima da lei, independentemente de sua função ou base de apoio político.
Especialistas consultados pelo Portal Colombense apontam que a manobra da Câmara poderia abrir precedente para uma espécie de “autoanistia parlamentar”, em que o Congresso julgaria seus próprios membros, decidindo quem pode ou não ser investigado pela Justiça. Tal cenário, se confirmado, comprometeria de forma profunda os alicerces da República.
Considerações finais
O caso Alexandre Ramagem é mais do que um embate jurídico. É o reflexo de uma disputa entre dois modelos de país: um baseado no respeito às instituições, à legalidade e à ordem constitucional; e outro que tenta, por vias paralelas, proteger interesses políticos específicos, mesmo que em detrimento da democracia.
Ao manter o processo penal contra Ramagem, o STF não apenas cumpre seu papel constitucional, como também reafirma para o Brasil e o mundo que as instituições brasileiras permanecem firmes frente às tentativas de desestabilização. Em tempos de crises políticas e disputas ideológicas acirradas, decisões como essa são essenciais para a manutenção da confiança pública no sistema de Justiça.
A sociedade, por sua vez, deve manter-se vigilante, cobrando ética, responsabilidade e compromisso democrático de todos os seus representantes — estejam eles na Câmara, no Senado, no Palácio do Planalto ou nas Cortes Superiores.
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Professor e jornalista Sadraque Rodrigues – Portal Colombense