
Não faltam vozes céticas quanto às mudanças climáticas no Congresso Nacional, com sua poderosa base ruralista, como se viu na agressividade de parlamentares contra Marina Silva, do Ministério do Meio Ambiente, em sessões recentes no Senado e na Câmara. Afora arroubos retóricos dos dois lados, cabe ressaltar que os fatos dão razão à ministra.
Relatos alarmantes sobre o clima, de fontes respeitáveis, brotam de todos os lados. De especial relevância para a população brasileira se afigura o estudo “Temporada das Águas: O Aumento das Chuvas Extremas”, segundo o qual a média anual de desastres por temporais no país dobrou de 899, no período de 2010 a 2019, para 1.885, de 2020 a 2023.
O levantamento partiu da Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica, coordenada pelo programa Maré de Ciência, da Universidade Federal de São Paulo (USP), com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, a Unesco e a Fundação Boticário de Proteção à Natureza.
Perdas econômicas saltaram 58%, de R$ 6,81 bilhões a R$ 10,76 bilhões em valores corrigidos. A agricultura arcou com cerca de 40% desse prejuízo.
O dado abrange só o custo direto das chuvas torrenciais. Ainda resta o cálculo das perdas com mudanças no início e no fim das estações úmidas e secas, a agravar as incertezas de uma atividade por natureza sujeita a riscos. No front das estiagens, as perspectivas também são sombrias.
A convenção da ONU sobre desertificação vem de divulgar pesquisa apontando eventos recordistas de seca de 2023 a 2025. Sob influência de um El Niño portentoso, só a parte brasileira da amazônia perdeu 33 mil km² de água superficial em 2023, uma área comparável a um Sergipe e meio.
Tamanha estiagem dá ensejo ao que se denomina de feedback positivo do aquecimento global: com a escassez extrema de água, mais árvores morrem, e o carbono de sua biomassa chega à atmosfera para agravar o efeito estufa. Ressecada, a mata se torna mais inflamável, com o que incêndios florestais realimentam o processo degenerativo.
São péssimas notícias para o agronegócio, e não somente na Amazônia Legal. Claudicam os chamados rios voadores, que transportam umidade para as regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil. Não é por outra razão que o pantanal tem enfrentado queimadas devastadoras.
Ondas de calor mortíferas se propagam pelo planeta. Nesta semana, o flagelo se abateu sobre a Europa, que viu termômetros galgarem o limiar de 40ºC e chegarem as primeiras mortes da canícula. Aumenta o recurso ao ar-condicionado, que leva a picos de consumo de eletricidade gerada em boa parte com a queima de combustíveis fósseis —mais carbono na atmosfera.
O ciclo vicioso de esquentamento planetário se propaga. E não há sinais de que a COP30, em Belém, possa encetar providências em medida suficiente para reverter a espiral desastrosa.